terça-feira, 30 de março de 2010

Despedidas



Despedidas são pequenas mortes, 
quando o momento se aproxima, o coração infla e, o corpo sente a dor. 
As lágrimas não encontram lugar para serem vertidas, 
A garganta se contrai e, um profundo suspiro se forma, 
como combustível que alimenta as lembranças de momentos passados,
os felizes e os tristes, os carinhos e brigas.
A música que marcou determinado momento, 
toca ao mesmo tempo em que o vento trás ao olfato o cheiro que não é seu,
mas que esteve impregnado em seu corpo por tanto tempo
Então as lágrimas encontram um canal para desembocar.
Rolam pela face dura de uma imagem que aparenta ser rígida, 
descubro que sou humano e que amo, 
que tenho sentimentos e que eles doem. 


Despedidas são pequenas mortes,
onde os corpos são postos num grande campo,
com os rostos virados ao Sol, num local de fácil acesso
com códigos específicos que apenas você sabe o caminho. 
Rostos e vozes que, provavelmente jamais tornarei a ver e ouvir em minha vida,
mas que deixamos uma cópia em nossos cemitérios secretos. 


Despedidas são pequenas mortes,
que darão origem à vida, 
e ela que nos impulsiona a continuar o caminho sem medo, 
mesmo tendo cada vez mais consciência de que,
as despedidas são pequenas mortes inevitáveis.


Clayton Fernando / 2004



quarta-feira, 17 de março de 2010

Quem não chora, não mama, segura meu bem, a escopeta!

  
            Ultimamente, os políticos brasileiros, representantes do povo, diga-se de passagem; tem apresentado atitudes um tanto inusitadas no campo da política.

            Desde já vamos separar bem, o que é política, o que é religião, o que é economia e o que é emoção. Todos os ingredientes devem ser tratados e trabalhados a distância. Se possuíssem rótulo, estaria escrito “Perigo – manuseie com cuidado”. Porém, Economia e políticas são braços do mesmo corpo e andam mais unidas que o ideal.

            O reino da emoção se estabeleceu primeiro em Brasília. O presidente Lula chorou ao ser diplomado pelo TSE, em 2002. Disse ele na ocasião, que apesar de não ter feito curso superior, recebeu seu “primeiro diploma” como presidente do Brasil. Imagina se a moda pega...

Alguns anos depois, na eleição do Brasil para sediar os Jogos olímpicos de 2016... chorou bastante e disse que “o mundo reconheceu a vez do Brasil”.. ótimo, todos ficaram comovidos com ele, que meigo, um presidente que não tem vergonha de chorar!

            Depois Lula chorou na FIESP ao falar do seu vice, José Alencar dizendo “foi uma dádiva de deus ter te encontrado”. Que lindo, fiquei comovido... um presidente que chora ao se referir ao vice.  Sem esquecer que ele também chorou em uma entrevista para o programa ‘Hoje em Dia’ da RedeTv! ao lembrar da primeira esposa, mineira... aí fiquei apaixonado pelo Lula! Além de ser presidente, não ter vergonha de chorar em cadeia internacional pelas olimpíadas, não ter vergonha de chorar pelo vice, também é romântico! Com certeza é o homem que toda dona de casa gostaria de ter.
 

            Em novembro, na Bahia, foi as lágrimas com um estudante da sétima série, quilombola, após o menino ter ganhado um certificado de uma redação sobre Zumbi dos Palmares... nossa, ele é um populista pai!

            No dia primeiro do ano de 2010, fora lançado um filme sobre sua vida “Lula, o filho da mãe do Brasil”... nem preciso dizer que o homem chorou ao ver sua vida na tela... e mais uma vez... além de presidente, é sensível, romântico, ‘diplomado’, ’pai do povão’, tem um filme sobre ele, se auto-intitula portador do “vírus da paz”... que vergonha alheia! Cansei, daqui a pouco vou começar a chorar também.


            Como se não bastasse um bebê desses, eis que vemos no Rio a moda pegando com nosso digníssimo Governador Sergio Cabral, que foi aos prantos com a ‘covardia’ que fizeram com os cofres o Estado do Rio de Janeiro na divisão dos Royalties do Pré-Sal... o bolso Estado deixa de arrecadar bilhões com a nova proposta de divisão. O homem chorou como criança para defender a baba que ganharia seu povo fluminense! E não fica por aí não... se o bebê chorou e não deram chupeta, bebê vai fazer pirraça!

            O governo organiza hoje a tarde, (17 de março de 2010) uma manifestação com concentração na Candelária, às 16:00 horas com destino a Cinelândia.
São esperados vários cantores(?) inconformados com a ‘covardia’. Só pessoas de grande expressão intelectual, como: Sandra de Sá, Leandro Sapucahy, Pedro Luis e a Parede, Gustavo Lins, MC Sapão, Grupo Revelação, Grupo Molejo, DJ Malboro, Pixote, Suingue e Simpatia, Nega Gizza e MV Bill,  DJ Sany Pitbull e neguinho da Beija-Flor, que comentou “Acham uma pedra de ouro na minha casa e sou obrigado a dividir contigo? Alô Congresso! Alô presidente Lula! Arra urrú! O petróleo é nosso! O Rio de Janeiro viu primeiro!”. Além das baterias da  Grande Rio, Salgueiro, Mangueira, Portela  e Vila Isabel. Eu mereço!!!!!
São esperados cerca de doze mil manifestantes de municípios vizinhos, e o Governo Estadual ordenou decretou liberação automática ponto facultativo aos servidores do Estado após as 15:00 horas, para que possam comparecer.

            Margarida S. (nome fictício), enfermeira do Hospital Estadual D. Pedro II, em Santa Cruz, comentou sobre a ordem recebida internamente. Diz que o governador pediu que todos os servidores possíveis e disponíveis fossem para a Candelária para a manifestação. Disse ela: “Pra cortar todos os benefícios da gente ele serviu, cortou rindo! Se juntou com o Eduardo Paes (prefeito) e cortou tudo, agora ele vem chorar e pedir pra gente se manifestar? Eu vou levar é uma faixa bem grande chamando ele de safado.” Acho que depois dessa declaração, nem preciso comentar muita coisa, fala por si mesma.

            Do jeito que as coisas caminham, é o povo brasileiro todo quem vai chorar, se todos os governadores resolverem atirar de sentimentalismo para alcançar objetivos, e se todos os presidentes do mundo quebrarem o protocolo e passarem uma imagem de sentimentalismo barato, nada mais funciona da maneira que deveria. Onde poderemos ser tratados como um país sério, se tentamos usar de chantagem emocional para alcançar as metas?

            Será mesmo que chorar e se auto-intitular pax-virulento, é pretexto para entrar num contexto internacional como a questão da Palestina e Israel, e tratar do assunto de forma praticamente leviana, é atitude de um chefe de Estado? Sinceramente, o Sr. Presidente não deve nem saber a origem do conflito entre esses dois povos, pra dar pitacos em seus territórios... mas quem se importa?! Eles são brasileiros, eles choram!!! São tão meigos e conseguem o que querem. Por favor me avisem quando diplomacia se tornou sinônimo de apelação sentimental.

            Ô Governo, ta me ouvindo?! Distribuam lenços pro povo, porque nós sim temos motivos pra chorar.  A educação continua ineficiente, a saúde pública (se é que ela existe) cada vez mais sucateada, pessoas aos milhares morrendo pelos corredores e sem atendimento, a corrupção continua rolando solta, sem eira nem beira, a marginalidade aumenta, a criminalidade aumenta, a alienação se multiplica a passos bacterianos!

            Sim, nós podemos chorar, porque lá nos altos cargos, não choram por você, choram por eles mesmos.
  
          

terça-feira, 9 de março de 2010

Morro da Quizumba - Parte II


Lembro-me como se fosse ontem, estávamos em casa assistindo televisão quando ouvimos rajadas de metralhadora, foi aquela correria, todo mundo se jogou no chão da sala, minha mãe saiu correndo pra fechar as portas e janelas, as rajadas ensurdecedoras continuavam como se estivessem na nossa porta, meu coração quase pulava pela boca de tanto medo. 


Então ouvimos um estrondo muito forte e a energia elétrica caiu. Parecia que estávamos no umbral, ouvimos os bandidos gritando uns aos outros do lado de fora que era invasão do morro do Caramujo, e atiravam morro abaixo, enquanto os invasores atiravam morro acima, sem rumo nenhum, pois a escuridão era cega, várias balas acertaram a nossa casa, o terror aumentava e todos nós juntos, abraçados no chão, suando durante horas com aquele show pirotécnico, olhei por uma fresta da janela do quarto e vi as balas traçantes riscando o céu, joguei-me no chão novamente, e ouvi minha mãe rezando, pois meu pai sempre trabalhou durante a noite e estava na rua naquele instante, e meus primos envolvidos também estavam na rua, no meio da bandidagem. Aterrorizados, ouvimos á distância um grito que se aproximava cada vez mais de nossa casa. 


Um dos bandidos invasores tinha pego o Deco, e o arrastava pelos cabelos pelas escadarias. Ele gritava pelo amor de deus, acho que deus não deve ter ouvido, ou estava muito longe naquela hora. Deco estava tão flagelado por ter sido arrastado morro acima, que parte de sua carne ficou presa pelas escadarias, aquela dor doía em nós, que desespero, jogaram o primo atrás de nossa casa, e enquanto pedia pelo amor de deus por sua vida, os invasores pegaram uma faca, amarraram num poste, e começaram a rir em êxtase enquanto cortavam aos poucos parte dos seus dedos das mãos, e os gritos aumentavam na mesma intensidade das gargalhada dos algozes, em seguida cortaram-lhe partes do braço e as orelhas, os gritos de Deco pararam. Não sabia se tinha morrido naquela hora ou desmaiado de tanta dor.

Meu tio Geraldo, como todo pai, desesperado correu para fora de casa para pedir pelo filho. Não deixaram sequer tio Geraldo falar mais que algumas frases, atiraram em sua cabeça, e disseram: "Isso é por você ter criado esse filho da puta". Minha mãe desmaiou no chão, minha avó teve crise nervosa. Realmente estávamos no inferno, e aquela noite não passava nunca. Diziam:

-    Traz esse viado aqui...

-          Pega logo essa porra desses pneu malandro, vamo fazê churrasco pra dar pra esses vagabundos saberem quem manda nessa porra! - Cadê a gasolina cumpadi?! (gritando) Cadê a porra da Gasolina cumpadi?! Fica ligado malandro, senão tu dança também. - Fica ligado aí, se subir x9 tu manda chumbo na lata - Aê cambada de bosta! (gritando aos moradores que estavam com certeza ouvindo), Vocês vão ver quem manda nessa porra! A Quizumba é nossa! E o safado que tentar peitar a gente vai tomar no cu bonito! Tô fazendo um churrasco aqui pra vocês! (gargalhadas, que escuto até hoje) 


-  Isso aí malandro, molha esse cretino, dexa ele bem ensopado que é pra fritar melhor... (tempo) pega o isqueiro... enfia esse viado dentro desses pneu que tu juntou, anda logo malandro, tá de caô?!... - Agora taca fogo nessa merda e deixa ele fritar! (gargalhadas)

Meu deus do céu, que agonia dentro de casa, não podíamos fazer nada, e isso doía, era como se estivéssemos num filme de terror, era como se tudo não passasse de um pesadelo e que eu iria acordar a qualquer momento. 

De repente o Deco acordou, e estava gritando horrivelmente, sua carne estava sendo queimada; por deus, ele ainda estava vivo! A borracha dos pnues derretia em seu corpo que queimava, e seus gritos com o tempo cessaram. 

Com certeza ali ele morreu, naquele instante, entre risadas, xingamentos, ao nosso lado, não podíamos fazer nada, e o corpo de meu tio ali a poucos metros de distância do filho. Como era de se esperar, o cheiro de carne queimada com borracha começou a invadir nossa casa e a vizinhança, vomitamos ali mesmo, todos nós, mas estávamos aterrorizados demais para conseguirmos nos mexer.